segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Experiência (in)esquecível



Eu estava preparado!


Fazia mais de uma semana que eu vinha pensando no que perguntaria, com quem me encontraria, na companhia de quem eu estaria.


Seria uma experiência única. Poucas pessoas passaram por isso e ter na memória a lembrança desses momentos poderia ser esclarecedor. Pelos menos para mim, que tenho diversas dúvidas não respondidas.


Chegou o dia. Eu não estava ansioso, apesar de ser a primeira vez que ia passar por aquilo e pedia apenas que fosse a única. A primeira parada: a sala de espera. Diversos rostos aguardando para passar por experiências tão semelhantes mas tão diferentes da minha. Por algum motivo, o ambiente transmitia uma estranha mas agradável serenidade. Passei alguns minutos ali, acompanhado de familiares.

Ao ouvir meu nome ser chamado, passei para uma segunda sala, onde fui apresentado à roupa que eu deveria vestir. Um avental branco com uma abertura atrás. Tive que ficar nu, sob protesto. Lembrei daqueles filmes de hospitais, onde os pacientes andam pelos corredores com a bunda aparecendo. Era a minha situação. Ainda bem que a segunda ordem era retirar qualquer pertence que possuísse no corpo. Imagina se, passando no corredor, o celular na minha mão caísse no chão? Abaixar para pegá-lo seria vergonhoso. E quem estivesse atrás de mim teria que lidar com a visão do inferno.

Em seguida, me chamaram para passar à terceira sala: a recuperação cirúrgica. Ah, sim, eu não havia falado o motivo do texto até agora. Eu ia fazer cirurgia de maxilar. Ia colocar dois pinos na mandíbula. Mas o motivo principal era a experiência que eu ia ter – de saber como era o outro lado e ter minhas dúvidas respondidas por alguém.  

Não caminhe para a luz! Era o que pensei quando deitei na cama e olhava aquelas pessoas ao meu redor que já estavam em situação de pós-operatório. Ao meu lado, uma senhora aguardava para fazer cirurgia de coluna. Percebi que o meu problema não era tão grande quanto o dela. 

Passados alguns minutos, dois técnicos trouxeram uma maca e me puseram nela. Entrei no corredor e via as luzes do teto passarem uma após a outra, enquanto eu era levado à sala de cirurgia. E a estranha serenidade da sala de espera me acompanhava pelo corredor. 

Entrei na sala de cirurgia e enxerguei alguns outros profissionais, que eu saberia a seguir serem o anestesiologista e a equipe de apoio do cirurgião. O cirurgião disse para eu ficar tranquilo que a cirurgia era simples (fazer um furo de cada lado na minha mandíbula e colocar os pinos era uma coisa simples, claro!). E eu começava a retomar o que iria perguntar quando estivesse do outro lado. É claro que essas EQMs (experiências de quase morte) só acontecem em situações de coma, mas eu esperava que o CARA lá em cima abrisse uma exceção e me contasse alguns segredos.

Em seguida, o anestesiologista veio e me disse palavras que eu jamais esquecerei: Eu vou colocar a anestesia aos poucos na veia e você vai – aos poucos – sentir que está com sono. Falado isso, lembro que eu apenas disse “tá” e apaguei! Só lembro quando acordei já na sala de recuperação. DETALHE: Eu não tenho a menor lembrança de Nada! Nada do que eu planejei ocorreu. Nenhuma imagem, nenhuma frase, uma total escuridão. Nenhum sonho. Nada. Maldito Midazolan! Nenhuma pergunta respondida, ninguém dizendo para o meu EU interior: Não vá para a luz!

Ok, talvez seja para eu não saber de nada mesmo. Vai saber as consequências disso?!?! Mas uma coisa é certa. Tá de bom tamanho, não quero outra experiência de cirurgia.
 
Me olhando no espelho agora penso em com quem estou mais parecido: Com um cachorro pequinês, com os dentes de baixo parecendo estarem à frente dos de cima? Ou com o personagem Kiko, do Chaves, com a cara em formato de lua? 


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