quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Do sofrimento humano e do alívio da alma

Passo pelos corredores dos andares do hospital e diante de algumas portas de quartos entreabertas, vejo o rosto daqueles que pela dimensão do seu sofrimento, que só os mesmos tem, procuram o amparo e a certeza de cuidados mais corretos para sua dor, na busca de ganharem uma sobrevida diante do mal que lhes acomete e seguirem em frente com suas vidas.


Mas no dia-a-dia vejo o outro lado também, o do sofrimento dos profissionais que, por suas diversas especialidades, sofrem calados tentando mascarar suas mais variadas dores, afim de realizarem um trabalho adequado para com aqueles que se encontram enfermos. Não que eles não se sintam enfermos de alguma maneira, seja na limitação que a profissão lhes impõe; na angustiante falta de voz que sentem diante da compensação por seu trabalho estar atrasada; pelo sentimento velado de incapacidade de ação perante os diversos quadros apresentados; da dúvida de um diagnóstico correto quando inúmeros sintomas agem de forma solta no frágil corpo que ali perece temporariamente, lhes dando a dura notícia de que o medicamento não está agindo de forma a aliviar o sofrimento alheio.


Passo pelos corredores dos andares do hospital e vejo rostos envelhecidos de pessoas entre seus trinta e cinqüenta anos, que pelo sofrimento de um familiar, perderam a alegria e o riso que outrora pudera ser visto em suas vidas, e as transformaram em idosos precoces, aguardando poder sorrir amargamente diante da notícia de uma possível evolução ou melhora do ente querido.


Quanto a mim, diariamente faço parte por alguns minutos da história dessas pessoas, buscando aliviar a angústia que levam no peito e que lhes aperta a garganta, ouvindo, confortando, sendo aquele a quem chamam para falar de seus problemas; aquele que por não conhecê-los a fundo, não irá fazer pré-julgamentos ou condená-los à priori por suas atitudes; aquele cuja responsabilidade pela orientação dada, os fará refletir de modo a perceberem que apesar do peso em seus ombros, do cansaço ou da dor, podem, ainda que de forma homeopática, acreditar em uma melhora de si mesmos ou do meio em que se encontram, diante de uma mudança na forma de verem as coisas e de atitude, encontrando quem sabe aí, um alívio para sua sobrecarga mental.


Diante da limitação que minha especialidade impõe, eu poderia me frustrar em não ver a melhora de um paciente por meio do medicamento que não posso prescrever, mas ao contrário, vejo no momento de minha intervenção, rostos mudarem de cor, de forma e até surgirem sorrisos e lágrimas. Após isso, quando passo pelos corredores dos andares do hospital, ouço meu nome sendo chamado outra vez por um familiar, um enfermo ou um profissional da equipe multidisciplinar, solicitando minha presença para mais um atendimento que lhes alivie o sofrimento da alma.


Autoria: Rodrigo G. Martins